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Maputo
O Banco Central de Moçambique acaba de subir as taxas directoras, nomeadamente, decidiu-se por uma subida da Taxa de Reserva Legal de 8,75% para 9%, da Taxa de Facilidade Permanente de Depósito de 4% para 5% e da Taxa de Redesconto de 15,5% para 16,5%. Esta decisão é a consequência das perspectivas crescentes de inflação para a economia moçambicana, muito pressionada, pela subida do preço do crude e dos bens alimentares.
O aumento da Taxa de Reserva Legal implica uma redução do multiplicador monetário, que por sua vez, reduz a massa monetária. Enquanto, a subida da Taxa de Redesconto implica uma contracção do activo do Banco Central (porque cede menos liquidez) e a consequente contracção da Base Monetária. Portanto, se a Base Monetária se contrai, necessariamente, a massa monetária sofre uma redução. O efeito desejado, é valorizar a moeda e reduzir o impacto da inflação. No entanto, uma política monetária restritiva tem impacto a nível do produto, a taxa de juro é o mecanismo de transmissão entre a esfera monetária e a esfera real, com uma subida do preço do dinheiro, existe um desincentivo para investir. Portanto, uma subida das taxas de juro implica uma redução do Investimento, por sua vez, investir menos implica uma redução do rendimento. Se as expectativas dos empresários se traduzirem por um menor rendimento disponível, então existe um ajustamento da produção que induz uma redução do emprego. Aliás, a própria Curva de Phillips evidencia a conflitualidade que existe entre inflação e desemprego, uma redução da inflação implica um aumento do desemprego. Para conhecer o desempenho futuro da economia moçambicana será importante seguir a natureza da política orçamental que o Governo irá adoptar no decurso deste ano e seguintes, se a política orçamental não acentuar os efeitos restritivos da política monetária, será natural, assistir a um forte abrandamento da actividade económica em Moçambique. Basta pensar no perfil do sector bancário do país, caracterizado por uma forte concentração que permite a obtenção de elevadas margens, não existindo um mercado bancário verdadeiramente concorrencial, estas medidas terão um impacto bastante mais agravado, com um brutal encarecimento do crédito que colocará imensos constrangimentos de tesouraria e a reavaliação de inúmeros projectos de investimento. Além disso, convém ter presente a pouca sofisticação do mercado financeiro, portanto, as empresas têm poucos instrumentos a sua disposição para reduzir a sua exposição ao risco de taxa de juro. É previsível um forte abalo no sector empresarial de pequena e média dimensão. Miguel Amaral
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O INE acaba de revelar que a inflação alcançou os 12,7% em 2010 (apesar de já ter lido na imprensa que o valor atingiu os 16,62%). Analisando os dados do INE podemos verificar que o mês de Dezembro foi dos mais caros em Moçambique, com uma variação mensal de 3,4%, quando a variação mensal durante o período entre 2008-2009 nunca ultrapassou o valor de 2,2%. Para este valor de 3,4% contribuiu a divisão de alimentos e bebidas não alcoólicas que registou um acréscimo de 17,41%. Decompondo um pouco mais os valores, verificamos que, o preço de tomate subiu 28,6%, do coco 44,2%, do frango vivo 10,0%, do peixe fresco refrigerado ou congelado 8,4%, da cebola 7,2%, da batata-reno 7,3% e do amendoim 3,0%. Um retrato bastante expressivo do peso da inflação na vida das famílias moçambicanas.
Por outro lado, constatamos, segundo dados revelados na imprensa, 2010 foi o melhor ano de arrecadação fiscal nos últimos 35 anos. Curiosamente, os meses com melhor performance fiscal foram Maio, Setembro (coincide com a explosão social) e Dezembro, respectivamente, com 6,4 mil milhões, 6,3 mil milhões e 6,2 mil milhões de meticais. Analisando um pouco mais os dados, podemos, verificar que os impostos internos têm uma participação de 63,5% na arrecadação fiscal enquanto os impostos externos contribuem com 36,5%. Curiosamente, o melhor mês na arrecadação dos impostos aduaneiros foi Dezembro com 2,5 mil milhões de meticais. Também verificamos que o Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas e Singulares começam a ganhar peso, representando 14,9% da receita fiscal. Mas o que realmente despertou a minha atenção nestes dados foi o facto do incremento da inflação coincidir precisamente com maiores níveis de arrecadação fiscal. O que faz pressupor a existência de um efeito de distorção económica, provocado conjuntamente, pela inflação e os impostos. Estas distorções económicas podem ter efeitos bastantes danosos na actividade do país, nomeadamente, porque podem provocar: 1. Falta de equidade fiscal porque a inflação pode alterar o peso relativo das taxas entre os contribuintes; 2. Alteração na eficiência económica, porque o sistema fiscal altera o impacto da inflação sobre as taxas de juro, a poupança, o investimento e o emprego. Por sua vez, a inflação altera o impacto do sistema fiscal sobre variáveis como o trabalho, poupança, investimento e o financiamento empresarial; 3. Alteração no equilíbrio orçamental, porque a não adopção de medidas correctivas, tem como consequência, uma maior arrecadação fiscal, portanto, uma maior facilidade no financiamento de programas de gasto público; 4. Alteração no tamanho do sector público, porque a ausência de ajustamentos nas leis fiscais pode afectar a dimensão, a taxa de crescimento e a composição dos gastos públicos, portanto, a não adopção de medidas de ajustamentos da inflação pode implicar a expansão do sector público. Por isso, se o Governo aceitar de forma passiva estas distorções na economia, estará a promover, o que J.B.Colbert definiu como “A Arte de Cobrar Impostos”. E numa sociedade democrática está prática não é compatível com princípios de legalidade, transparência e responsabilidade política. Miguel Amaral Achei bastante interessante a entrevista do fiscalista norueguês Odd-Helge Fjeldstad, especialista em fiscalidade africana, concedida ao Jornal O Pais. Vou tentar reproduzir as suas ideias-chave e acrescentar algumas ideias minhas.
A entrevista está focada na necessidade de Moçambique se transformar num país com auto-suficiência fiscal com o objectivo de reduzir a sua dependência em relação a ajuda financeira externa. É notório, como já aqui comentamos, o crescimento económico moçambicano é muito alavancado via ajuda financeira externa. No entanto, não considero a ajuda financeira externa como algo necessariamente mau, ao contrário, de alguns economistas africanos, que argumentam, as ajudas financeiras apenas fomentam a corrupção. Eu penso que a ajuda financeira externa é positiva quando existe responsabilidade mútua, entre quem doa e quem recebe, quando existe um rigoroso controlo dos fundos e quando são aplicados com racionalidade económica. O fiscalista norueguês começou por apontar, que o primeiro passo seria criar uma administração fiscal eficiente, de modo, a permitir aumentar a base tributária, por sua vez, o aumento da base tributária iria permitir diminuir a carga fiscal. O interessante, é analisar as consequências que este processo implica. Em primeiro lugar, tal como, o fiscalista aponta, seria necessário terminar com as isenções fiscais das grandes multinacionais que operam em Moçambique, nomeadamente, na exploração de recursos naturais. O facto, das grandes multinacionais serem isentas constitui um estímulo para a evasão fiscal porque os operadores de menor dimensão também não vão estar dispostos a pagar impostos. Além disso, a fiscalidade para estas multinacionais não funciona como um factor de atractividade ou de retenção, a decisão de investir depende dos fundamentais da própria indústria. Em segundo lugar, o grande problema é o peso que a economia informal representa na economia moçambicana, existem dados que apontam para 40 a 50% da economia, o desafio passa por incorporar o informal na economia formal, algo, que antevejo difícil, principalmente, porque o sistema fiscal moçambicano é complexo e pesado, além disso, o seu relacionamento com o cidadão não prima pela exemplaridade, sendo preferível, ficar fora do sistema. O fiscalista aponta para uma maior previsibilidade fiscal, mais simplificação e uma menor pressão do sistema sobre o cidadão como forma de integrar a economia informal, além disso, aconselha evitar a desregulamentação na aplicação das taxas e um maior combate à corrupção, nomeadamente, o combate a determinadas categorias de excepção fiscal. Penso que o fundamental, será reduzir a economia informal através da criação de empregos na economia formal, nomeadamente, emprego digno e qualificado. Neste aspecto será importante estimular e criar condições para um sector privado mais competitivo e empreendedor. Por fim, o fiscalista aponta, para que a evasão fiscal seja incluída na agenda nacional e com o patrocínio do próprio Presidente da República, neste aspecto, considero que já entramos no campo da utopia. No entanto, não deveria de ser assim. Miguel Amaral A economia moçambicana tem conhecido crescimentos expressivos durante estes últimos anos, muito recentemente, o FMI projectou um crescimento da economia de 7,2%, no entanto, a última referência que encontrei sobre a inflação, apontava para uma taxa de 15,52% referente ao mês de Setembro.
Este nível elevado da inflação deve-se fundamentalmente ao incremento do preço das importações, de certa forma, Moçambique foi vitima das pressões especulativas que se verificaram nos mercados internacionais de matérias-primas e bens alimentares, que forçaram uma subida de preços destes activos, convém, não esquecer que existem veículos financeiros que incidem, por exemplo, sobre cereais, toda esta engenharia financeira construída com base em produtos derivados teve esse efeito de elevação dos preços. Por outro lado, Moçambique caracteriza-se por uma ausência de tecido produtivo, o que fomenta uma grande dependência do país em relação ao exterior, nomeadamente, relativamente as importações. Esta ausência de produção interna, quer seja, ao nível do sector agrícola ou do sector industrial, não permite ao país aumentar a sua produção de forma a promover um efeito de substituição das importações e inclusivamente fomentar as exportações, portanto, o país não tem capacidade de captação de divisas, logo, também não possui capacidade para financiar a diversificação da sua economia, sem que isso implique uma considerável depreciação da sua moeda e o correspondente incremento da inflação. Por isso, não é de estranhar que grande parte da execução orçamental tenha sido feita com monitorização externa, nomeadamente, com a intervenção do BM e FMI que facultaram ao país o financiamento necessário para atingir os objectivos macroeconómicos propostos. Não foi há muito tempo que o BM facultou mais 85 Milhões de dólares ao Governo moçambicano. Parece-me que o crescimento moçambicano é artificial porque não se traduz pelo desenvolvimento dos sectores chave da economia, não se manifesta no desenvolvimento local das populações, Moçambique não deixou de ser um país deficitário em todos os sectores de actividade, a sua população não consegui sair da precariedade e vive com grandes carências, o seu crescimento económico é inflacionado, é alavancado via BM/FMI e muito concentrado na exploração de recursos minerais por um número muito restrito de empresas. Miguel Amaral A mais recente revisão económica do FMI sobre Moçambique, aponta para um desempenho macroeconómico forte da economia, com uma estimativa de crescimento do PIB que pode alcançar os 7,2%. Esta projecção é explicada pela recuperação da procura externa, apesar, do ambiente externo ser adverso para a economia moçambicana, com o agravamento do preço das importações e a menor atracção de Investimento Directo Estrangeiro, algo que, segundo os analistas do Fundo penalizou a Balança de Pagamentos do país.
Gostava de reflectir um pouco sobre a magnitude das taxas de crescimento, para um economista europeu ou norte-americano, uma taxa de crescimento do PIB na ordem dos 3% já é considerado um valor excelente, porque, é um nível que já permite criação liquida de emprego na economia. Portanto, é um valor de referência para muitas economias ocidentais porque é sinónimo de saúde económica e condição de progresso, permitindo atingir bem-estar social e melhorar a qualidade de vida dos cidadãos. Pelo menos, é assim interpretado pela generalidade das pessoas. Mas se consideramos o valor de 3% excelente, então, o valor de 7,2% é magnífico, no entanto, não é um valor suficientemente elevado para permitir criar emprego, aumentar o consumo privado e reduzir a pobreza em Moçambique. Um valor de 7,2% é expressivo, pode impressionar, mas não desmente a realidade de Moçambique, um país extremamente pobre, com baixos níveis de rendimento per capita (€854), com pouco trabalho qualificado e uma elevada economia paralela (condição necessária para assegurar a sobrevivência do agregado familiar perante a escassez do rendimento disponível). Portanto, a economia moçambicana crescer 7,2% é manifestamente insuficiente para permitir uma distribuição mais equitativa do rendimento, permitir o emergir de uma classe média, permitir o crescimento do consumo privado, é claramente, insuficiente para assegurar o desenvolvimento social e o progresso económico do país. Tanto é assim, o mês de Setembro foi palco de violentas revoltas sociais perante o anúncio do Governo de aumentar o preço de alguns bens essenciais, é a manifestação mais clara da precariedade em que vive a generalidade da população moçambicana e que nem crescimentos espectaculares de 7,2% conseguem disfarçar. Nem sempre crescimento económico é sinónimo de bem-estar social, no caso moçambicano, crescimentos explosivos de 7% não significam necessariamente uma transformação social e económica do país, para que tal aconteça, é necessário que a economia cresça a níveis bem superiores, nomeadamente, a dois dígitos. Miguel Amaral Os acontecimentos do início do mês de Setembro ainda estão bem presentes na memória de todos os moçambicanos. A capital Maputo caiu no caos quando teve conhecimento que o seu custo de vida iria atingir níveis insustentáveis.
Para esta situação contribuiu, o facto, de Moçambique ser um país deficitário a nível alimentar, com uma produção agrícola insuficiente, portanto, uma elevada percentagem do consumo alimentar moçambicano é assegurado pelas importações. Também verificamos como com a globalização se diversificaram os veículos de investimentos, que hoje podem incidir sobre matérias-primas ou inclusivamente sobre bens agrícolas, com a crescente especulação nos mercados e o reforço da procura desses bens, assistimos como aumentaram dramaticamente de preço. Portanto, um dos passos essenciais para reduzir a exposição inflacionária de Moçambique (consequência de importações mais caras), é garantir a auto-suficiência alimentar do país. Para atingir este objectivo é necessário aumentar a produção nacional de acordo com as necessidades do país, o aumento da produtividade agrícola tem que ser acompanhado com investimento nas infra-estruturas do país para permitir o adequado escoamento dos produtos, tem que existir incorporação de tecnologia agrícola e uma aposta na investigação agrária que permitam o desenvolvimento de sistemas de irrigação, de sementes, de fertilizantes e a incorporação de maquinaria para trabalhar à terra, somente, desta forma será possível incrementar a produção nacional e reduzir a dependência exterior. Este estimulo poderá ser reforçado se os país desenvolvidos eliminarem as suas politicas agrárias proteccionistas e permitirem que os países pobres em desenvolvimento possam exportar a sua produção em igualdades de circunstâncias, porque desta forma evita-se o estrangulamento da produção interna nos países pobres e permite-se a captação de divisas para que esses países possam financiar o seu desenvolvimento. Miguel Amaral |